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segunda-feira, 24 de abril de 2017

Vítor Gaspar e a ditadura “esclarecida” dos falsos tecnocratas

Daniel Oliveira, in Expresso Diário, 20/04/2017)

 
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Três dirigentes do FMI, o nosso Vítor Gaspar, Sanjeev Gupta e Carlos Mulas-Granados, vão, segundo o Público, lançar um livro onde, entre outras coisas, pretendem responder a esta pergunta: “O que pode ser feito para reduzir a influência da política nas decisões orçamentais?” Eu tenho uma resposta: instituindo uma ditadura tecnocrática para impor aquilo a que eles chamam “política orçamental correta”. Também é esta a resposta que eles têm para dar.
Assistimos, nos últimos anos, ao ascenso de uma classe de técnicos e académicos, mais ou menos visionários e voluntaristas, que aprendeu nos centros de reeducação em que se transformaram as faculdades de economia a acreditar que as suas convicções ideológicas estão no terreno da “economia positiva” e que as convicções ideológicas que as desafiam não passam de “economia normativa”.
Com base na convicção inabalável de estarem do lado certo da ciência, olham para qualquer opção de política económica que se desvie da sua ortodoxia como umas trafulhices para ganhar votos. E imaginam um mundo governado por homens sábios e independentes dos caprichos da turba.
Longe do banho de humildade que a democracia impõe aos voluntaristas, provando-lhes que a realidade é sempre mais complexa do que uma fórmula, estes “sábios” empurram as Nações e o mundo para soluções radicais, cruéis e insensatas. Paul Krugman descreveu bem estes aspirantes a tiranos: “São românticos profundamente destituídos de sentido prático. São, na verdade, uma casta peculiar de românticos enfadonhos que, em vez da poesia, se fazem ouvir numa prosa afetada. E as coisas que eles exigem em nome das suas visões românticas são muitas vezes cruéis, implicando sacrifícios enormes aos trabalhadores e às famílias comuns. Mas o facto é que essas visões são guiadas por sonhos acerca de como as coisas deveriam ser e não por avaliações sensatas de como as coisas são. Para salvar a economia mundial temos de tirar esses românticos perigosos dos seus pedestais”.
Quando Vítor Gaspar e dois altos dirigentes do FMI lamentam, num livro prefaciado por Christine Lagarde, a interferência da política na elaboração de orçamentos não estão a exibir a sua ignorância. Eles sabem que o novo poder só pode pertencer a políticos não eleitos, disfarçados de técnicos. Eles defendem um despotismo global esclarecido
O domínio ortodoxo da academia, conseguido através da sua transformação numa fábrica de quadros para empresas financeiras, e que permite que alunos de economia cheguem ao fim do curso sem ler uma linha de qualquer autor alternativo ao pensamento dominante, corresponde a um domínio ideológico que o poder económico, com os seus interesses específicos, impôs ao conjunto da sociedade.
O que permite que técnicos de topo escrevam uma tal insanidade sem que sejam tratados como ignorantes descerebrados. Mas a questão é muito mais profunda do que a mundividência ideológica em que vivem estes novos profetas, muitas vezes avençados a interesses bem mundanos.
O processo de globalização deslocou os centros de poder para longe das nações. E, longe das nações, não há nem povo, nem controlo democrático. Temos recebido essa lição amarga na história recente da União Europeia, que, a dado momento, teve de escolher entre integração ou democracia. Mas mesmo para os líricos que ainda acreditem na possibilidade de existir uma democracia europeia que transcenda, pela primeira vez na história, a coincidência entre Estado-Nação e soberania democrática, ninguém acredita que possa vir a existir, proximamente, uma democracia global. O que quer dizer que a economia e as suas principais instituições reguladoras funcionam à escala global e as democracias, com as suas instituições eleitas, mantêm-se na escala nacional.
Suspeito que seja disso (ainda só li o que saiu na imprensa) que estes diretores do FMI, dois deles com experiência política anterior, estejam a falar neste livro prefaciado por Christine Lagarde. Eles não são apenas técnicos. São políticos não eleitos que pretendem ter (e têm) a tutela sobre os que dependem da vontade do povo. Para eles, o papel da democracia resume-se, escrevem-no no livro, a “uma competição para ganhar os votos das pessoas e conquistar o direito a exercer o poder”. Os cidadãos tratam, na escala nacional, de escolher os gestores da política definida por quem realmente escreve o programa: as instituições internacionais, ainda mais permeáveis ao poder financeiro e económico do que as que dependem de eleições. Vítor Gaspar não é o primeiro a escrevê-lo. Já citei várias vezes um relatório da JP Morgan de 2014, em que se explicava que as democracias nacionais e a participação popular na vida coletiva eram um entrave a um aprofundamento da integração europeia.
Quando Vítor Gaspar, Sanjeev Gupta e Carlos Mulas-Granados lamentam a interferência da política na elaboração de orçamentos não estão a exibir a sua ignorância. A lavagem ao cérebro que se faz nas faculdades de economia não chega para homens inteligentes e informados ignorarem que a primeira das razões para a existência de parlamentos é a elaboração de orçamentos. Já ouviram a expressão “no taxation without representation” e imaginam todas as implicações políticas da expressão. Sabem que os orçamentos são um instrumento para políticas sociais, culturais e económicas que definem as grandes escolhas feitas por uma sociedade. Sabem, apesar de nos dizerem que não, que o orçamento não é um fim em si mesmo e que falar numa “política orçamental correta” é esvaziar a da política de contradições. Talvez até saibam, mas não juro que o seu neoliberalismo científico seja autoconsciente, que eles próprios representam escolhas políticas e ideológicas determinadas.
A coisa é mesmo o que parece: eles não acreditam numa democracia que seja mais do que “uma competição para ganhar os votos das pessoas e conquistar o direito a exercer o poder”. Eles sabem que este processo de globalização, que a instituição que dirigem ajuda a regular e a impulsionar, é incompatível com a democracia e com a interferência do povo (através de eleições) nas grandes escolhas económicas. Porque transporta o poder para um lugar onde os eleitos e quem os elege não pode chegar. Eles sabem o novo poder só pode pertencer a políticos não eleitos, disfarçados de técnicos que sabem o que é a “política correta”. Eles defendem um despotismo esclarecido. Mais do que nacionalistas, populistas ou revolucionários, eles são, nos tempos que correm, os mais perigosos, poderosos e militantes inimigos da democracia.
 
Ovar, 24 de abril de 2017
Álvaro Teixeira

domingo, 26 de fevereiro de 2017

Goodfellas



 

(In Blog O Jumento, 24/02/2017)
good_fellas

Há pouco tempo, quando surgiu o caso dos Panama Papers, os jornalistas do Expresso e da TVI desdobravam-se com denuncias, asseguravam o envolvimento de muitas empresas, sugeriam um lado negro da economia. Como aqui se previu a montanha pariu um rato, limitaram-se a aproveitar uma má fase do dono da Bial para o sacrificarem e, como era de esperar, o tema acabou por ir parar ao Caso Marquês. Ainda recentemente o Expresso se gabava de terem sido os seus jornalistas a descobrirem a conexão entre Bataglia e os dinheiros de Carlos Silva.
Quem agora ouve um tal Tiago na SIC Notícias ou a Graça Franco na RTP  chega a pensar que as offshores são espaços financeiros mais transparentes do que a agência da CGD da esquina. Que há acordos de dupla tributação, que os impostos podem ser cobrados passados 12 anos, que o dinheiro pode servir para pagar mercadorias, enfim, tudo coisas muito transparentes.
Se o dinheiro vai ali e volta porquê pagar a um escritório de advogados para criar uma empresa numa ilha desconhecida onde apenas tem uma caixa de correio? Será para pagar mercadorias que se manda milhares de milhões de euros para ilhas onde não se deixava a esposa ir passar férias sozinha sem meia dúzia de guarda-costas?
De um dia para o outro as malditas offshores são paraísos no bom sentido, locais mais confiáveis do que o banco da esquina. Aliás, o dinheiro dos nossos capitalistas honestos vai para as offshores, só os pobres e os traficantes de droga é que usam os bancos nacionais.
Depois de tão grande procissão de crentes nas virtudes das offshores não seria de admirar que se venha a registar uma correria de velhinas em direcção aos escritórios de advogados para constituírem empresas offshore para lá guardarem as poupanças que agora estão escondidas debaixo do colchão.
Os bandidos, afinal, são os funcionários do fisco, ou são descuidados e distraídos, ou incompetentes, ou, como sugeriu o tal fiscalista da SIC, há aqui a mão de corruptos. Os nossos capitalistas não fogem, intencionalmente ao fisco, os funcionários do fisco é que são distraídos e não lhes cobram os impostos. Os nossos políticos e os seus homens de mão dos altos cargos do Estado são tudo gente muito empenhada, honesta e competente, os funcionários mais modestos é que são descuidados, incompetentes e corruptos.
No fim disto tudo os que levaram o dinheiro pela porta do cavalo são empresários modelo, os políticos estão acima de qualquer suspeita, os altos dirigentes escolhidos por critérios de confiança desses políticos são gente dedicada, a culpa é dos outros e cabe à IGF encontrá-los.
Mais uma vez vale a pena contar a anedota do comadre que foi ao bordel e ao meio do divertimento com duas meninas foi apanhado pela rusga. A primeira menina era cabeleireira, a segunda era manicura e o pobre homem perguntava aos guardas "querem ver que a puta sou eu?".
PS: Agora que anda por aí tanto DG e ex-secretário de Estado a assegurar que o fisco era uma máquina, talvez valha a pena recordar a famosa lista Lagarde. O que é feito dela? Recorde-se que segundo o Expresso nesta lista constavam 200 portugueses, o que não é nada mau para um país de tesos. Como o Prof. Azevedo Pereira vai ao parlamento, talvez fosse boa ideia questioná-lo sobre esta lista, na ocasião o SEAF disse que lhe tinha dado instruções sobre esta lista. Com ordens ou sem ordens do governo era obrigação da AT actuar, será que o fez ou a pica persecutória e repressiva é ou era só para quem se esquece de pagar 100 euros de IRS?

Talvez não fosse má ideia juntar a lista Lagarde, os Panamá Papers e os 10.000.000.000 de dinheiro de gente exemplar e comparar a eficácia do fisco na cobrança de multas do imposto de circulação ou a vender casas de pobres com o que faz no combate à evasão fiscal por parte de ricos.

Ovar, 26 de fevereiro de 2017
Álvaro Teixeira


sexta-feira, 29 de julho de 2016

O Bom, o Mau e o Vilão


Este é o título de um filme que vi na minha juventude, mas cujo nome continua a ser atual, porque neste mundo ainda continuam a haver bons, maus e vilões e é baseado nisto que vou escrever este artigo, depois de conhecida a decisão da Comissão Europeia sobre o não cumprimento do nosso défice relativamente às contas do Estado do ano de 2015.
Muita água correu debaixo das pontes, até que fosse encontrada uma solução para uma situação que nos foi imposta e que falhou redondamente.

No lado Bom tenho que colocar o presidente da Comissão Europeia, Jean Claude Juncker, que não cedeu às pressões dos “eurocratas”, tendo reconhecido que a Comissão foi,
Jean Claude Juncker
também, uma parte do problema. Deste lado bom tenho que colocar o nosso primeiro ministro, António Costa, o ministro das finanças, Mário Centeno, e Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que fizeram um enorme trabalho, para que as sanções prometidas e, quase, dadas como inevitáveis, tivessem sido colocadas de lado. Embora, do meu ponto vista, esta Europa continua a ser forte contra os fracos e fraca contra os fortes, mas a situação está a alterar-se devido aos muitos erros e omissões cometidos ao longo do tempo, essencialmente, após a saída de Jacques Delors.


No lado Mau está o FMI que não acertou uma e, apesar dos seus “altos quadros” estarem em Portugal em quase regime de permanência e pagos a peso de ouro, nunca se aperceberam que as suas receitas, em vez de curar, iam matar o doente e de uma forma
Cristhine Lagarde (diretora do FMI)
muito rápida. Os portugueses sentiram as alergias que lhes provocavam os medicamentos que lhes eram impostos e que, se não houvesse alteração da medicação, a suas vidas estavam por um fio. Neste lado tenho que colocar os “médicos e enfermeiros” que compunham o governo PSD/CDS que, quando viam os doentes entrarem em convulsão lhes diziam que a medicação estava certa e iriam melhorar brevemente. A maioria dos doentes, quando se apercebeu que tinha uma porta do hospital aberta, em 6 de Outubro de 2016, fugiu por ela e procurou outras formas de tratamento. O “diretor do hospital” queixa-se, agora, de que roubaram o hospital e a maioria dos seus doentes e estes, por sua vez, aconselham-no a fazer um tratamento psiquiátrico, como revelam os últimos inquéritos de opinião. Afinal a doença tinha cura, mas não com a medicação que lhes estava a ser ministrada. Basta ler o relatório do Independent Evaluation Office, um órgão independente do FMI, mas que faz a análise das suas políticas.


No lado do Vilão tenho que colocar o Eurogrupo, uma organização não estatutária, mas
Jeroen Dijsselbloem
que influencia muito, presidido por um “pirómano” Jeroen Dijsselbloem,  que se diz socialista, mas talvez a sua doutrina política tenha sido aprendida ao lado os fundadores da “terceira via”, como Tony Blair e Shroëder que abriram o caminho para a implantação, na Europa, do neoliberalismo de Milton Friedman e da Escola de Chicago, cujos efeitos nefastos se fizeram se fizeram sentir no Chile, nos EUA, no Reino Unido e, desde há mais de uma dúzia de anos, na nossa Europa.




Mas, como dizia Lenine “em muitas décadas não se passa nada, mas numa década podem passar-se muitas décadas”.


Ovar, 29 de Julho de 2016
Álvaro Teixeira